Crise ‘ajudou’ a diminuir os roubos de carga em SP

Diário de São Paulo – Enquanto o governo de São Paulo comemora a redução de 16% nos casos de roubo de carga no estado, em setembro, caminhoneiros que buscam fretes no Terminal Fernão Dias, na Zona Norte, atribuem o fato ao desaquecimento da economia, que reduziu a procura pelas viagens.

“O número de roubos a carga caiu porque tem menos caminhão nas estradas”, disse o caminhoneiro Vanderlei Pacheco, 50 anos, no ramo há 25. “Há um ano, este terminal estava fervendo de gente e de ofertas de viagens. Hoje está às moscas. Está tudo parado. Não tem viagem.”

De acordo com estatísticas da SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo), a redução verificada em setembro neste tipo de crime interrompeu uma tendência de alta de 15 meses seguidos. Em números absolutos, foram 903 roubos em setembro de 2016 e 759 registros no mês passado, com uma redução de 144 casos. Mesma diminuição, entretanto, não se deu no acumulado do ano. De janeiro a setembro, a SSP registrou 8.040 casos, contra 7.027 no mesmo período do ano passado, com um avanço de 14%.

Para o caminhoneiro Ítalo Figueiredo, 48 anos, outro que estava no Terminal Fernão Dias na última quintafeira, não há o que comemorar. “O crime funciona de acordo com a demanda”, disse. “Cai o movimento e os ladrões migram para outro tipo de roubo mais lucrativo.”

De fato, pesquisa nacional realizada com supervisão da ANTT (Agência Nacional de Transporte Terrestre) revelou queda no faturamento do setor  de cargas de cerca de 19% neste ano. Já a SSP disse que medidas adotadas contra os roubos de cargas, com ações conjuntas realizadas pelas polícias, contribuíram para a redução desta modalidade criminal em setembro. “Dentre as iniciativas estão operações do policiamento Tático Ostensivo Rodoviário, com bloqueios e abordagens a caminhões de carga, além de patrulhamento em postos”, afirmou a pasta.

Estudo mostra os quatro trechos mais perigosos

No mapa mundial das estradas mais perigosas para o transporte de carga, o Brasil se encontra em oitava posição. O levantamento é da JCC Cargo Watchlist, relatório mensal elaborado pela Joint Cargo Commitee, um comitê misto formado por representantes da área de avaliação de risco do mercado segurador de Londres (Inglaterra).

Estudos realizados pelas associações de transportes de cargas do Brasil apontam os quatro piores trechos com relação a risco de roubo. O primeiro deles é a BR-116, entre Rio de Janeiro e São Paulo. Dentro dessa rodovia, a Via Dutra, os pontos com maior índice concentram-se na Baixada Fluminense (no Rio) e em Guarulhos (Grande São Paulo).

Outro trecho considerado de alto risco fica na BR-101, entre Bahia e Alagoas. Atrasos em obras de duplicação da rodovia fazem com que a estrada apresente más condições de uso. Dessa forma, motoristas precisam reduzir a velocidade e, com isso, ficam expostos a assaltos nessa estrada.

O terceiro pior trecho fica na BR 365, entre Mato Grosso e Minas Gerais. Por último, a SP-348 (Rodovia dos Bandeirantes) e a SP-065 (Dom Pedro) dividem o quarto lugar entre as mais perigosas. Na Bandeirantes, os maiores riscos ficam nos quilômetros 90, 94 e 97, onde a visibilidade para o motorista é pior. Já na Dom Pedro, o ponto mais perigoso fica na altura da entrada do Aeroporto Campo dos Amarais, onde há pouca iluminação.

Motorista considera SP mais seguro

Foto: Nelson Coelho/Diario SP

Edvaldo da Silva, 38 anos, mora na cidade de Caetés, em Pernambuco. Caminhoneiro há 15, ele viaja todas as semanas para São Paulo e garante preferir os fretes para este estado em comparação aos de outros. E não só pela qualidade das estradas.

“Minas Gerais e Rio de Janeiro são muito mais perigosos com relação a roubo de carga”, afirmou. “Em São Paulo acontecem roubos, mas em menor quantidade. E são menos violentos.”

De fato, no Rio de Janeiro, para cobrir os elevados custos com segurança e minimizar os prejuízos com o roubo de cargas, transportadoras passaram neste ano a cobrar uma taxa extra das empresas que contratam os seus serviços.

Batizada de Taxa de Emergência Excepcional, ela foi instituída exclusivamente na capital fluminense, que passa por grave crise na segurança e vê os índices deste tipo de crime dispararem, com aumento de 180% em quatro anos. A taxa prevê a cobrança de R$ 10 por fração de 100 quilos de carga, mais um percentual do valor da mercadoria que varia de 0,3% a 1%.

De acordo com dados da Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro), no ano passado os prejuízos com roubos de cargas no Brasil chegaram a R$ 1,4 bilhão. Ao todo, foram 22.547 ocorrências. Só no Rio de Janeiro foram 9.870 casos, o que representa 43% do total no país.

O cenário de insegurança faz com que empresas aumentem os planos de gerenciamento de risco para o trânsito de cargas no Rio de Janeiro. “Isso inclui proibições de circulação em algumas áreas de extremo risco e de viagens noturnas”, disse Ricardo Guirao, diretor de Transportes da Aon Brasil, empresa especializada em soluções em riscos. “Em alguns casos extremos, as seguradoras estão declinando a cobertura de mercadorias mais visadas, como alimentos, celulares, eletrônicos e higiene e limpeza.”

Profissão de alto risco nas estradas de todo o país

Depoimento_ Aldemir Silva, caminhoneiro

Já fui assaltado quatro vezes passando com carga por São Paulo. Não sinto que diminuíram os roubos. O que percebo é menos polícia nas estradas. Carrego ferro e cobre, que são cargas muito visadas e não consigo trabalhar sossegado. Na última vez em que fui vítima estava passando por Suzano, na Grande São Paulo, com quatro mil rolos de fio de cobre, uma carga avaliada em R$ 290 mil. Só não levaram a carga porque estava com escolta. Mesmo assim, um dos seguranças foi baleado e, por sorte, não morreu. Infelizmente a polícia só serve para multar a gente nas estradas e nas ruas da cidade. Não protegem o caminhoneiro, que tem de dar a cara para bater. Essa nossa profissão é uma das mais perigosas que existem. Tem que gostar muito para sair de casa todo dia e não saber se vai voltar. É coisa para maluco, mesmo. Eu mesmo não sei até quando vou aguentar essa vida.