Falta de transparência no processo de privatização da BR 262 no ES preocupa autoridades

A falta de transparência da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) no processo de concessão do trecho capixaba da rodovia BR 262 preocupa entidades e prefeitos de cidades cortadas pela BR que liga o Espírito Santo a Minas Gerais.

De acordo com o prefeito de Ibatiba, Luciano Pingo, que é presidente do Consórcio do Caparaó e diretor de Agricultura da Associação dos Municípios do Espírito Santo (AMUNES), no último dia 7 ocorreu em um hotel na Praia do Canto, em Vitória, uma audiência pública organizada pela ANTT, para apresentar detalhes do processo de concessão do trecho capixaba da rodovia. No entanto, ele reclama da falta de divulgação e a baixa representatividade dos municípios que serão impactados com a privatização da BR 262.

Luciano Pingo disse que mesmo sem terem participado da audiência, as entidades que representam os municípios buscaram informações sobre o que está sendo proposto e há pontos que preocupam os prefeitos e que devem ser melhores discutidos.

“Infelizmente a gente compreende que esse modelo de discussão que a ANTT está realizando sobre a privatização da BR 262 não atende aos anseios da população que vivencia diariamente esse traçado de estrada. A gente entende que é necessário debater melhorias nas rodovias, não estamos contra o processo de concessão, mas estamos pleiteando que ocorra de forma democrática, mais transparente e acessível aos cidadãos”, afirma o prefeito Luciano Pingo.

Quem também reclama da falta de transparência da ANTT é o prefeito de Domingos Martins, Wanzete Kruger, que classifica a questão como preocupante.

O empresário do setor de turismo em Domingos Martins, Arthur Wernersbach, também não concorda como está sendo feito o processo de privatização da rodovia.

“Uma obra como essa não pode e não deve ter início sem que todos os envolvidos e impactados sejam ouvidos ou ao menos convidados a conhecer a proposta. O que a ANTT fez passa longe de ser uma audiência pública. Creio que a maioria absoluta dos municípios entende a necessidade de duplicar a BR 262, mas é injusto o formato que está proposto. Estão pensando exclusivamente no lucro, enquanto usuários diários como produtores rurais, estudantes, trabalhadores, etc., terão um forte impacto em seus orçamentos”, avalia Wernersbach.

Impacto

Segundo Luciano Pingo, pelo modelo que se pretende implantar, por exemplo, a população de Ibatiba, para ir até Vitória, terá que pagar três pedágios para ir a capital e mais três no retorno.

“Como fica a situação do agricultor que é o principal alicerce da nossa economia? Temos agricultores de Pedra Azul, em Domingos Martins, que vão todos os dias na Ceasa em Vitória para levar seus produtos para alimentar o cidadão que mora região metropolitana. Esse agricultor possivelmente terá que pagar quatro pedágios, dois na ida e dois na volta. Ele terá que aumentar o preço de seu produto ou reduzir o seu ganho que já é quase zero”, analisa o presidente do Consórcio do Caparaó.

“Essa situação tem que ser revista e muito bem conversada, pois vai prejudicar e muito o povo da agricultura e do turismo que transita várias vezes ao dia pela BR. Pessoas que vão trabalhar ou estudar na capital terão despesas grandes ao fim do mês. Nós, prefeitos, os donos de pousadas, restaurantes e outros empresários, temos que nos unir para tentar uma nova audiência que esclareça para nós o motivo pelo qual está sendo implantado e que justifique a inciativa, sem que traga danos para a população e os municípios”, comenta o prefeito de Domingos Martins.

Mobilização

Luciano Pingo afirma que está buscando o auxílio dos prefeitos da região “cortada” pela BR 262, da Assembleia Legislativa e da bancada federal no Congresso Nacional para garantir a rediscussão do projeto de privatização da rodovia.

“Segundo a ANTT, na audiência pública que ela realizou em Vitória, outra audiência não será realizada. Nós já temos um exemplo da BR 101, no ES, que foi concedida pelo Governo Federal para a iniciativa privada e infelizmente quase nada foi cumprido de melhorias, mas o povo está pagando o pedágio. O que nós queremos é garantir melhorias nas estradas, mas de forma que a população não seja a parte mais sacrificada. O Consórcio do Caparaó vai lutar incansavelmente para mudar essa realidade de debate da privatização da BR 262”, finaliza Pingo.

Pontos questionáveis

*A proposta não deixa claro quais os trechos que não serão duplicados;

*Qual garantia os usuários terão de que o cronograma de realização da obra será executado dentro dos prazos? (vide os problemas já enfrentados na Concessão da BR 101);

*Por que não foi feita a mobilização adequada, tendo em vista o impacto e a importância de uma obra como essa para centenas de milhares de pessoas que vivem nas cidades que dependem da rodovia para se deslocar?

*A localização das praças de pedágio, com preços previstos de R$ 11,00 penaliza demais moradores que utilizam a rodovia para atividades diárias.

Praças de pedágio

A AMUNES detalhou o impacto de cada praça de pedágio para os município no entorno da BR 262. Confira!

Viana

Uma praça de pedágio, ainda no município de Viana, vai impactar milhares de produtores rurais, que se deslocam diariamente da região Serrana e outros municípios cortados pela 262 para a Ceasa. Eles são responsável por mais de 60% na Central de Abastecimento, e quase em sua totalidade agricultores de base familiar.

Essa mesma praça de pedágio vai impactar estudantes e trabalhadores, principalmente de Domingos Martins, Marechal Floriano, Brejetuba, Venda Nova do Imigrante, Conceição do Castelo, Irupi, Ibatiba e outros que diariamente se deslocam para as universidades, faculdades, IFES e para seus locais de trabalho e etc.

Pedra Azul e Venda Nova

Uma praça está prevista para ficar entre Pedra Azul e Venda Nova do Imigrante, penaliza “de forma cruel” os moradores dessas cidades, que se deslocam várias vezes por dia em função de suas atividades, bem como os municípios de Brejetuba, Conceição do Castelo, Ibatiba, Irupi, Iúna, Muniz Freire e outros.

Ibatiba

Uma terceira praça de pedágio prevista para o município de Ibatiba, antes da cidade, levando-se em consideração o sentido Vitória x Ibatiba, prejudicará a população do município sede, bem como das cidades de Iúna, Irupi e outros.

Moradores dos municípios como Ibatiba, Iúna e Irupi passarão a pagar no mínimo três pedágios diariamente até Vitória.

A rodovia é o eixo utilizado por todos os municípios nos deslocamentos de serviços de saúde, principalmente, para a Grande Vitória. São dezenas de deslocamentos diários, levando e trazendo pessoas que buscam na região Metropolitana serviços que ainda não existem nos municípios.

Minuta

Pela minuta, a proposta da tarifa básica de pedágio, por praça, é de R$ 8,54 para pista simples e R$ 11,10 para pista dupla. Foram definidas, para o sistema rodoviário, 11 praças de pedágio. São elas:

Km 419+000 Caeté BR 381 MG

Km 354+300 João Monlevade BR 381 MG

Km 286+350 Itabira BR 381 MG

Km 233+600 Belo Oriente BR 381 MG

Km 179+250 Periquito BR 381 MG

Km 149+750 São Domingos do Prata BR 262 MG

Km 63+500 Manhuaçu BR 262 MG

Km 18+050 Martins Soares BR 262 ES

Km 147+750 Ibatiba BR 262 ES

Km 97+050 Venda Nova dos Imigrantes BR 262 ES

Km 26+600 Viana BR 262 ES

Audiência satisfatória para a ANTT

Procurada pela reportagem, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) disse que divulgou amplamente a Audiência Pública nº10/2019 e as sessões públicas relativas a ela, fazendo muito mais do que exige a Resolução nº 5.624/2017, que estabelece as regras de divulgação das audiências públicas.

“Foram enviados avisos de pauta e convites para a imprensa pela rede social Whatsapp para 119 números da imprensa nacional e para os principais veículos da imprensa de MG e ES. A Assessoria Parlamentar enviou convites por e-mail aos parlamentares no Congresso Nacional, informando da Audiência Pública nº10/2019. Também foram enviados convites para os municípios por onde passa a rodovia (temos o relatório de aviso de recebimento de cada e-mail). Portanto, consideramos que a divulgação da a Audiência Pública nº10/2019 foi satisfatória e muito além do que a legislação exigia à época”, diz a ANTT, em nota.